Axé

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Homenagem ao imperfeito

Nunca foi muito atenta a datas, mas era impossível deixar de pensar que, há exatamente um ano, era ela, desapercebidamente ao encontro da distante, mas conhecida... paixão desenfreada. Daquelas que tiram o fôlego e do prumo. ...Estava viva. E viva novamente, podia sentir cada milímetro de seu corpo vibrar as dores, os arrepios e a ansiedade. Como as de quem nunca beijou. A sensação de virgindade àquilo que se mostrava tão novo, tão inusitado, e ao mesmo tempo e secretamente tão esperado, fazia-lhe toda palpitar a cada imaginação mais descontida. Tudo era estranho e deliciosamente excitante, uma vez que encontrara uma versão sua em outro gênero. Será que você sou eu? Perguntavam-se ambos, e ela cega pela doce bruma do entusiasmo pueril. Incontáveis coincidências e similaridade de histórias e interesses insistiam em surpreender cada vez mais aquela simbiose de almas. Insistindo em coincidir, a semelhança não poderia deixar de passar pelos fluidos. E da intersecção fluídica veio o veredicto. Não, não era possível. Era perfeito demais, para duas criaturas que, apesar da congruência repentina de almas, nunca imaginavam cruzar olhares até então. Foi perfeito até demais. Juras, promessas e declarações de amor eterno tiveram cada uma sua quota, em fazer daquele momento uma indescritível e adorável adolescência tardia. Foi tudo lindo, pois não teve tempo de enfeiar. Tanto, que  jamais daria certo. Não teve tempo de se tornar real, com todos os problemas e as possíveis soluções de vidas reais. Jamais seria no plano palpável e mesquinho do que é humano. Foi, então, preciso agarrar-se ao que era concreto e que, dolorosamente apresentava-se para ela. E, como um curativo à ferida, adaptou-se rangendo a tangibilidade dos fatos. Hoje, quando pensa no que se perdeu pela margem e depois de ruminar a covardia alheia e suas fraquezas, ponderar e contrapesar suas perdas e ganhos, ela se dá o luxo de um longo suspiro de olhos fechados e um sorriso irônico de canto de boca. É ela, viva. De novo. Uma viva adulta. Pois tudo que pretende ser adulto se lança seco no que é real e anseia pelo que é humano e irremediavelmente falível. Seu desejo hoje é pelo que é corajoso e despudoradamente imperfeito.